sábado, 5 de maio de 2012

Deslegalização

Um sistema como o de nossa Administração Pública, claramente contaminada por vícios estruturais, com técnicas próprias de Administrações atuante em países desenvolvidos, poderia ensejar preocupantes abusos e desvios de toda espécie. O uso de cláusulas gerais ou termos altamente indeterminados para afetar direitos fundamentais das pessoas, embora constitua técnica legítima do ponto de vista teórico, pode traduzir sérios riscos ao regime democrático e às liberdades públicas no Brasil, na medida em que não controles de gestão. Há que se reconhecer limites a essas técnicas de atuação, mesmo que se as admitam como ferramentas inafastáveis da gestão pública contemporânea.

Sem dúvida, o tipo sancionador deve conter grau mínimo de certeza e previsibilidade acerca da conduta reprovada, o que exige do intérprete uma movimentação racional pautada por critérios de razoabilidade e proporcionalidade na definição do conteúdo proibitivo da norma jurídica. Tampouco cabe uma deslegalização completa em matéria sancionadora, de modo que a lei possa abrir espaço para uma atuação administrativa inferior arbitrária, ilimitada e descontrolada, sem o necessário status para restringir liberdades individuais. A processualização das decisões públicas, dentro de cânones de razoabilidade e celeridade, é um instrumento de progresso nos controles e na gestão qualificada, em busca de uma tutela equilibrada dos direitos em jogo.

Veja-se que, na definição de Eduardo García de Enterría, "la técnica de la deslegalización de limita a un plano formal de manipulación sobre el rango de la ley". (...) "Una ley de deslegalización opera como contrarius actus de la ley anterior de regulación material, pero no para innovar directamente esta regulación, sino para degradar formalmente el rango de la misma de modo que pueda ser modificada en adelante por simples reglamentos".

Nem as chamadas normas em branco podem dispor arbitrariamente de suas próprias competências. Não é possível uma lei sancionadora delegar, em sua totalidade, a função tipificatória à autoridade administrativa, pois isso equivaleria a uma imsuportável deterioração da normatividade legal sancionadora, violentando-se a garantia da legalidade. (Fábio Medina. p. 230/231).

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Exemplo de inconstitucionalidade: artigo 161 do CTB. "Constitui infração de trânsito a inobservância de qualquer preceito deste Código, da legislação complementar ou das resoluções do Contran [...]. Parágrafo Único. As infrações cometidas em relação às resoluções do Contran terão suas penalidades e medidas administrativas definidas nas próprias resoluções". 

Há no caso ilimitada delegação de poderes. A autoridade tornou-se competente para criar novas sanções.É uma cláusula de deslegalização. 

Diferente seria a hipótese de o legislador utilizar a técnica das "normas em branco", técnica francamente admitida no sistema brasileiro. Ocorre que tais normas devem conter uma mínima explicitação da conduta proibida, um núcleo básico inviolável pela autoridade administrativa.

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